Quando meu marido desmaiou vestido de Papai Noel, durante o Natal do ano passado, eu não poderia saber tudo que estava por vir nesses próximos meses. A internação, a recuperação, a fisioterapia, a fonoaudióloga. Tanta gente entrou e saiu da minha casa, cada um com uma receita mágica ou um remedinho santificado por João de Deus, o Papa ou qualquer outra eminência espiritual. Eu, que nunca acreditei em muita coisa, passei a agarrar qualquer fio de esperança que caisse no meu colo. Era fitinha do bonfim, crucifixo do Vaticano, água benta, rosário pra cá e pra lá o dia todo.
E o tempo foi passando, essas coisas todas viram rotina. A doença vira rotina e a gente se acostuma com a companhia da enfermeira. A única coisa que não me parece natural é ele, deitado, vazio e mudo. As vezes eu converso esperando que ele me responda, mas isso nunca acontece e o buraco vai crescendo. Eu queria que terminasse, porque esse luto está se estendendo sem motivo. Milagre só acontece ao longe, por mais que a fé aqui seja grande.
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